As últimas semanas foram marcadas por um clima de tensão e medo envolvendo as fronteiras do Brasil, Colômbia e Venezuela. A recusa do governo de Nicolás Maduro em receber ajuda humanitária tem gerado um mal estar entre as nações vizinhas, ameaçando até mesmo um confronto armado como há décadas não se vê na América Latina.
Diante desse preocupante cenário, é de extrema importância entender os reais motivos que culminaram no atual caos enfrentado pela população daquele país. A história recente aponta como um dos principais responsáveis o finado ditador bolivariano Hugo Chavez, que comandou o país com mãos de ferro entre 1999 e 2013. Contudo, é necessário voltar ainda mais no tempo para compreender esse fenômeno e estabelecer uma relação entre falhas de gestão e a busca pelo poder.
A Venezuela é hoje um dos maiores produtores de petróleo do mundo, com 96% das exportações relacionadas ao petróleo e seus derivados. A exploração desse produto, iniciada em 1922, foi acompanhada por uma sucessão de golpes e acordos de todos os tipos envolvendo partidos políticos e empresas privadas. Em 1973, com a crise do petróleo, o país resolveu estatizar todas as empresas petrolíferas, centralizando-as na PDVSA (Petróleos da Venezuela). Desse modo, com o poder econômico centralizado nas mãos do Estado, as empresas privadas voltaram suas atenções quase que exclusivamente para esse grande cliente, deixando a população desassistida.
O grande salto econômico do país ocorreu na década passada, ainda no governo Chavez, injetando na Venezuela mais de US$ 750 bilhões. O Estado, aproveitando esse singular momento, tomou decisões que custariam muito caro para si mesmo e para a população. A estratégia equivocada de adquirir da iniciativa privada o controle de bancos, siderúrgicas, indústrias alimentícias, dentre outras, colocou a nação numa situação de extrema vulnerabilidade que poderia colocar em cheque todo planejamento econômico. E isso não demorou a ocorrer. Com a retração do setor privado, entre 2008 e 2015, houve uma superelevação do déficit público. Aliado a isso, a produção diária de petróleo despencou de 3,2 milhões de barris por dia para 1,5 milhão e a cotação do barril diminuiu de US$ 103, em 2014, para pouco mais de US$ 35, em 2017. Não precisa ser um matemático ou economista para saber o resultado de tamanho prejuízo.
Diante desse quadro devastador, a saída encontrada pelo Estado para superar a crise foi ainda mais equivocada. Sem recursos para pagar os funcionários públicos, o governo resolveu imprimir mais dinheiro. Assim, com mais moeda no mercado do que produtos para serem adquiridos, a inflação disparou. Segundo estimativas do FMI, em 2019 a inflação na Venezuela ultrapassará 10 milhões por cento. A título de comparação, durante a hiperinflação do Brasil, na década de 1980, a inflação média do país foi de 233,5% ao ano.
Resumo da ópera: a ânsia pelo poder, aliada a noções pifiamente limitadas de princípios econômicos, fizeram com que uma nação com invejáveis recursos naturais saísse de uma promissora potência econômica continental para uma protagonista da maior crise humanitária da história recente da América Latina.
Fabiano Santana dos Santos – Doutor em Serviço Social e Professor Adjunto no curso de Administração, na Universidade Federal de Alagoas, campus Arapiraca. Contato: [email protected]