Por Weber Andrade
“Dotô, deita gemeno, peida fedeno, que só veno. De noite eu meto a p… Aí ela grita. Amanhece com a b… vermeia que nem fogo na ribada.” O relato, pode até ter sido inventado, mas também pode ter existido e ocorrido em um consultório aqui de São Chico, pérola de algum matuto que não queria levar a patroa ao médico e decidiu fazer a consulta por ela. Quem me contou acabou de deixar este plano, vítima de um AVC, e foi meu amigo desde a adolescência até a morte, que o pegou de surpresa, mas não de forma traiçoeira. Ela até foi generosa nos avisos, mas ele parecia mais preocupado em ser feliz, até morrer.
Falo do meu amigo Ebenézer Oliveira da Silva, o Bené, servidor da Secretaria Municipal de Agricultura há décadas, contador de causos, amante da natureza e exímio cachaceiro. Digo isto porque sei que o Bené não se incomoda, lá de cima, com o rótulo. Tomávamos muitas doses, desde sempre e, talvez, esse pode ser um dos motivos que ajudou Deus a decidir busca-lo mais cedo. Na Secretaria de Agricultura era muito querido por (quase) todos e estava sempre defendendo os mais necessitados. Infelizmente, busquei e não encontrei sequer uma foto do Bené, em vida, mas não tive coragem de registra-lo dentro de um caixão.
Temos a mesma idade, 57 anos, e fomos parceiros de muitas aventuras no final da década de 70, junto com o Ivom Moreira, hoje servidor estadual, lotado na Ciretran de Barra de São Francisco e pouquinho mais idoso do que nós, pois já chegou aos 58. Estou grafando o nome dele com M no final, porque foi assim que aprendi a escrevê-lo, mas esta semana nosso amigo criou uma página no facebook e grafou Ivon. Que seja, continuaremos amigos.
Nossa primeira traquinagem juntos, quando o Ivom ainda era funcionário da lanchonete do Posto Alvorada, lá na Vila Landinha, foi quando o Bené descobriu que a promoção da Pepsi, que dava prêmios – na verdade, outra garrafa do refrigerante – por cima da tampinha tinha uma falha fácil de perceber: as garrafas premiadas tinham o azul da tampinha um pouco mais claro do que as não premiadas. As cores da Pepsi, como todos sabem são azul, vermelho e branco, como na bandeira dos EUA, de onde vem a multinacional que as fabrica.
Depois começamos a passear na vizinha Mantena, onde íamos em busca das namoradas que não conseguíamos aqui, três pés rapados, sem grana e com pouca beleza. Lá também não arrumávamos nada, mais por timidez do que por falta de oportunidades.
O Ivon, único que tinha dinheiro, também tinha fama de pão duro, mas de vez em quando punha no bolso um “Barão” e íamos para a cidade vizinha gastar e flertar com as meninas. Naquela altura ninguém de nós consumia bebida alcoólica, atolávamos a cara na vaca preta ou amarela…
Curiosamente, a última vez que vi o Bené, também o viu o Ivom. Nosso amigo andava meio trôpego pela feira livre da Rua Mineira e o Ivom chegou a dizer que ele não iria aguentar muito tempo.
– Está acabadinho o nosso amigo, lamentou Ivom.
Defendi. Disse que ele deveria ter passado a noite em claro e decidiu ir à feira comer um pastel e tomar um caldo de cana.
No início de outubro, fui vítima de uma trombose na perna esquerda. Como disse o Paulinho da Ótica, é a conta chegando.
Nesta segunda-feira, soube pela irmã do Bené que ele teve um AVC também no início do mês. Como, nesse período, não frequentei a Vila Landinha, onde costumava atualizar a prosa com o Bené, dia sim e outro também, não fiquei sabendo da sua avaria.
Deus foi mais generoso comigo, ou achou que ainda não é a minha hora de prestar contas lá em cima. Fiquei “internado” na casa do meu amigo Cícero Heitor, por quase um mês, mas escapei. Já o amigo Bené não teve jeito, foi chamado e nem sequer pudemos nos despedir. Mas hoje, sei que ele, de onde estiver, vai ler esta crônica e saber que continuaremos amigos, sempre.