Não se sabe se foi pelo clima beligerante, mas até o site da Assembleia Legislativa (Ales), chegou a sair do ar na tarde desta segunda-feira, 15, durante a sessão virtual da Casa para analisar projetos do Executivo e parlamentares. Ainda bem que a sessão foi virtual, pois o clima de guerra por causa da ação de 5 deputados na última sexta-feira, 12, quando eles teriam invadido o Hospital Estadual Dório Silva, na Serra, poderia até ter provocado uma briga física entre deputados.
O maior embate se deu entre os deputados Enivaldo dos Anjos, ex-líder do Governo na Ales e o deputado bolsonarista Capitão Assumção, com quem Enivaldo tem tido vários desentendimentos ao longo deste mandato. Dos Anjos já chegou a defender o direito de opinião de Assumção em um caso polêmico, onde ele oferecia dinheiro para quem matasse o assassino de uma mulher em Cariacica.
Depois disso, no entanto, a relação dos dois azedou e, ontem, 15, eles chegaram a trocar ameaças de saírem na porrada. Tudo por causa da ação dos parlamentares no hospital da Serra. Enivaldo, que começou o seu discurso em tom moderado, pedindo compreensão para o momento de crise, não se conteve ao ser interrompido pelo colega pro várias vezes e disse que Assumção é um “parlamentar que não tem respeito por ninguém” e que teria “problemas impublicáveis”.
O clima acalorado permaneceu na Casa durante toda a sessão, com a maioria dos deputados contra a ação dos colegas no hospital. O presidente da Comissão de Saúde da Ales, Hércules Silveira, o Dr. Hércules, aproveitou o momento para alfinetar o colega Vandinho Leite.
“Ninguém está impedido de fiscalizar. Eu tenho ido, não na pandemia, mas levo o MPES comigo, não a imprensa, e vou em dia útil, na hora do expediente, para encontrar a diretoria do hospital, que é quem pode respondera pela instituição. Se quiser ser prefeito da Serra, desse jeito não vai chegar lá não”, disse Dr. Hércules.
Notícia-crime – Ainda ontem a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) enviou ao Ministério Público uma notícia de crime contra os deputados que foram ao Hospital Dório Silva, na Serra, na última sexta, ver como estava sendo realizado o atendimento de pacientes tratados de Covid-19. O grupo, composto por Vandinho Leite (PSDB), Danilo Bahiense (PSL), Capitão Assumção (Patriota), Lorenzo Pazolini (Republcanos), Torino Marques (PSL) e Carlos Von (Patriota), é acusado de invadir o hospital.
Segundo a “notícia de crime”, os deputados teriam cometido “Invasão das instalações do Hospital Dório Silva, referência no tratamento de pacientes com covid-19”. Eles ainda teriam transitado entre as alas do local, inclusive no setor de isolamento, sem a observância dos protocolos sanitários. Assim, teriam provocado risco de contaminação de servidores e pacientes, além dos próprios parlamentares.
Por isso, o Estado pede à procuradora de Justiça que aprecie os fatos que poderiam ser enquadrados no artigo 268 do Código Penal: “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”.
O documento indica ainda que os parlamentares poderiam ter sido motivados por pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro em redes sociais. “Como é notório, o Presidente da República, no dia 11/06/2020, através de um pronunciamento realizado nas redes sociais, incentivou seus seguidores a invadir hospitais para checar a efetiva ocupação de leitos. Em referida ‘live’, sugeriu à população o seguinte: ‘tem um hospital de campanha perto de você, tem um hospital público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente tá fazendo isso, mas mais gente tem que fazer, para mostrar se os leitos estão ocupados ou não, se os gastos são compatíveis ou não’”.
A Procuradoria do Estado disse ainda no documento enviado ao Ministério Público que “causou espanto à sociedade capixaba e revolta entre os profissionais da saúde o fato de meia dúzia de deputados estaduais se prestarem a esse papel vergonhoso de tentar confrontar os dados oficiais divulgados pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), acerca da efetiva ocupação dos leitos de unidade de terapia intensiva (UTI), a partir da invasão e inspeção in loco de hospital público em época de grave pandemia, conduta que colocou em risco a vida de pacientes e servidores”.
Versão dos deputados
Danilo Bahiense
O deputado Danilo Bahiense disse, por meio de nota: “O parlamentar Danilo Bahiense utilizou dos EPIs e de todas as medidas de assepsia orientadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Ao longo deste mandato, o deputado tem realizado fiscalizações, direito e dever do político garantidos por lei, não só em hospitais, como também em delegacias da Polícia Civil, batalhões da Polícia Militar e unidades prisionais, prezando por melhores condições e com produção de relatórios com sugestões de soluções.
Ressalta que não houve qualquer tipo de invasão à referida unidade de saúde, havendo um pronto recebimento dos valorosos servidores”.
Capitão Assumção
“Cada um tem uma forma de atuar. Essa notícia de crime é baseada na nota emitida pela Secretaria de Saúde. Mas, não teve nada disso de invasão. Lá no Dório Silva fomos muito bem recebidos, fomos tratados com muita educação e recebemos denúncias sérias.
Os deputados não tiveram acesso a áreas restritas e respeitamos isso. Fizemos a visita de forma respeitosa, todos os deputados trajando o que poderia e fizemos o que está dentro das nossas funções constitucionais.
E todo mundo sabe que defendo o presidente Bolsonaro 24 horas por dia, mas a visita não teve nada a ver com a fala dele no dia 11. Essa ação já estava combinada há mais de uma semana e cumprimos o nosso papel que é de fiscalizar o Executivo”.
Lorenzo Pazolini
“Na última sexta-feira, 12, o deputado Lorenzo Pazolini e outros parlamentares estiveram no Hospital Estadual Dório Silva, após receberem inúmeras denúncias sobre as condições de trabalho do local. Os deputados cumpriram um de seus deveres primordiais, que de acordo com inciso XIII, do artigo 56, da Constituição Estadual do Espírito Santo, é fiscalizar e controlar os atos do Poder Executivo, inclusive os da administração indireta.
Além de haver indícios de corrupção no Dório Silva, houve a constatação de que os colaboradores não receberam EPI’s adequados para o trabalho. Também foi verificada a ausência de medicação adequada à sedação de pacientes.
Ao contrário do que foi dito, covardemente, não houve invasão, tendo em vista que os parlamentares se identificaram e tiveram a entrada franqueada à Unidade Hospitalar, sendo inclusive acompanhados pelos servidores do Hospital, com quem tiveram intenso diálogo sobre os problemas que estão passando. Além disso, não houve quebra de protocolos sanitários, pois foram adotadas todas as medidas de segurança e respeitados os protocolos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e Anvisa. Importante também deixar claro que ninguém entrou em UTI’s, tampouco nas salas vermelhas.
Vale ressaltar que não foi a primeira vez que houve fiscalização por parlamentares. Pazolini, por exemplo, desde que assumiu o mandato recebe denúncias e realiza visitas de inspeção, apresentando sempre relatórios ao final para que sejam tomadas providências”.
Carlos Von
“Após receberem diversas denúncias de falta de leitos, e, após o Ministério Público Federal classificar os dados de UTI’s do estado como enganosos, os deputados organizaram a visita ao Dório Silva antes da fala do Presidente da República.
NÃO HOUVE INVASÃO, a entrada foi AUTORIZADA, NÃO HOUVE INGRESSO NAS INSTALAÇÕES INTERNAS DE UTI E DE ENFERMARIA e NÃO HOUVE QUALQUER TIPO DE REGISTRO DE IMAGENS. A VERDADE É QUE NÃO HÁ VAGAS DE LEITOS DE UTI, NÃO EXISTEM MÁSCARAS N-95 PARA OS SERVIDORES e NÃO HÁ SEDATIVOS PARA OS PACIENTES.
O governador do ES culpa os outros por seu fracasso e persegue aqueles que o fiscalizam. Primeiro culpou o governo federal, depois culpou a população e, por último, culpou os médicos. Atacou o MPF e, agora, persegue os deputados que estão exercendo seu papel constitucional. Atitudes claras de um governo perdido e totalitário. Estamos do lado da população e não vamos ceder às essas agressões”.
Vandinho Leite
“Faz parte do Estado democrático de Direito a apresentação da notícia crime, mas aos noticiantes cabe a responsabilidade pelas acusações. Estarei à disposição do Ministério Público para esclarecimentos dos fatos, sem qualquer temor.
Como já expliquei por diversas ocasiões, não houve o cometimento de crime capitulado no Artigo 268 da Código Penal, uma vez que não houve qualquer ato invasivo ou ferimento aos protocolos sanitários.
Ação realizada por nós deputados foi calçada na Constituição da República em seu artigo 49, inciso X, que dispõe sobre o dever de fiscalizar, respeitando nesse momento as regras de saúde pública.
As irregularidades encontradas em nossa fiscalização são de tamanha gravidade que merecerão as mais diversas reprimendas, e sempre que a vida dos capixabas estiver em risco, não me acovardarei”.
(Weber Andrade com Webales e A Gazeta)